segunda-feira, 12 de março de 2012

Entrei em trabalho de parto durante um parto


Viviane Monteiro, 33 anos, obstetra, mãe de Pedro, 4

Depoimento a Heloiza Camargo

  arquivo pessoal
Quando descobri que estava grávida, decidi trabalhar até o final da gestação. Sou obstetra e tinha pacientes com bebês para nascer, não iria deixá-las na mão. Era 22 de junho, estava com 39 semanas e quatro dias de gravidez... e um parto para fazer. Por volta das 23 horas, já na sala de cirurgia, comecei a sentir algumas dores. Pela minha experiência, sabia que eram contrações. Sim, entrei em trabalho de parto durante o parto de uma paciente.
As dores eram intensas e tinham ritmo. O doutor Julio Alzeier, obstetra-chefe, até falou: “Hoje você não está me ajudando tão bem, está acontecendo alguma coisa?”. Não tinha jeito. Quando as contrações vinham, acho que ficava diferente, e ele percebia. Mesmo assim, respondi que estava tudo bem. Primeiro porque sabia que um trabalho de parto é demorado, ou seja, ainda tinha tempo até o meu filho nascer. Depois porque quis deixá-lo tranquilo para terminar o parto da paciente. E tinha também outro fator importante. Quando estava na sexta semana de gravidez, o Julio, que era meu obstetra, brincou que o bebê iria nascer no dia do aniversário dele, 23 de junho – e eu não estava acreditando que isso fosse mesmo acontecer.
No final do parto da paciente, as contrações vinham a cada 10 minutos. Meia-noite saí do hospital e fui para casa, a 50 metros dali, de carro. Nesse pequeno trajeto, só conseguia pensar que ainda faltavam algumas coisas na mala do bebê e na minha. Cheguei, organizei tudo, tomei um banho e só então liguei para o Julio e acordei o meu marido, que é cirurgião cardiovascular. Fiz isso porque não queria deixá-lo agitado – não adiantou muito, porque aí ele ficou espantado de saber que eu não tinha avisado antes.
Então, duas horas depois, a mesma equipe com quem eu tinha feito o parto da paciente estava ajudando no nascimento do meu primeiro filho. Todos me perguntaram por que não tinha contado. Não falei nada porque não queria afobar ninguém. Cheguei no hospital com quatro centímetros de dilatação e, durante a madrugada, a bolsa estourou e evoluí para dez. Queria e tentei muito o parto normal, mas a equipe chegou à conclusão de que a criança era grande para a minha pelve. Pedro nasceu com quatro quilos às 10h15 do dia 23. Ao mesmo tempo que estava consciente, por ser obstetra, era a primeira vez que tinha a emoção de sentir na pele o que é ter uma criança. Posso dizer que me tornei uma médica melhor depois de ter vivido as sensações do parto.
O tempo que permaneci na maternidade foi de festa – no meu quarto nunca tinha menos do que 15 pessoas. Havia todo um contexto: os meus colegas de profissão estiveram presentes no parto, tive o Pedro no local onde trabalho e era também aniversário do Julio (atualmente somos sócios). Até hoje, todo 23 de junho, ele liga lá em casa para cumprimentar o Pedro. Aí já aproveito e dou os parabéns para ele também.
Ah, aquela paciente do dia 22 perguntou por que eu não tinha passado na visita do dia seguinte – ela e o marido não perceberam o que estava acontecendo. Os meus colegas disseram que era porque eu havia entrado em trabalho de parto e tido o meu filho horas depois. Ela quase não acreditou!

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