sábado, 4 de agosto de 2012

Londres: tecnologia, planejamento e organização

A cidade que recebe a Olimpíada começou sua preparação antes mesmo do final dos Jogos de Pequim e mostra soluções que podem ser repetidas pelas sedes da Copa de 2014 ou pelo Rio em 2016


Londres: tecnologia, planejamento e organização Emerson Souza/Agencia RBS
Com segurança dos turistas que foram até Londres garantida, a lição para o Rio de janeiro precisa ser assimilada pelas autoridades           
Há um lema filosófico que poderia estar inscrito na Union Jack, a bandeira azul, vermelha e branca do Reino Unido. É a divisa positivista de Auguste Comte, razoavelmente conhecida dos brasileiros:
"Ordem e progresso".
Nesta Olimpíada londrina, talvez os britânicos não tivessem o amor por princípio, como pregava Comte, mas tiveram a ordem por base e o progresso por fim.
O progresso, é evidente, significa fazer uma Olimpíada em que tudo, ou quase tudo, funciona a contento, sem dificuldades para quem assiste ou para quem trabalha no evento. Isso os ingleses estão conseguindo. E estão conseguindo porque têm a ordem por base. Tal ordem, naturalmente, só existe porque existiu, antes, criterioso planejamento.

Os voluntários
A seleção dos 70 mil voluntários, por exemplo, começou a acontecer em 2008, quando os chineses ainda se ufanavam da Olimpíada de Pequim. Foram recebidas inscrições do mundo inteiro. Durante três anos, os organizadores entrevistaram e investigaram os candidatos. Em 2011 realizaram as primeiras entrevistas por telefone. Os aprovados receberam passagens para vir a Londres para mais uma etapa da seleção. Submeteram-se a uma prova. Os que restaram participaram de um workshop em um fim de semana londrino.
Os voluntários dispõem de hospedagem, alimentação e transporte gratuitos. Estão por toda parte, não apenas nas sedes das competições, mas também nas ruas, nas estações de trem e metrô, nas rodoviárias e em outros pontos estratégicos da cidade, como apoio ao trabalho policial.

A polícia
O trabalho policial, aliás, é um dos destaques da organização. O corpo londrino da Scotland Yard foi reforçado com agentes do interior da Ilha, e isso quer dizer policiamento ostensivo MESMO. Os policiais se movem em grupos debaixo de seus capacetes altos. São educados e bem humorados, sorriem a todo momento, e, num paroxismo de descontração, posam para tirar fotos com os turistas.

Se em algum lugar não há um policial por perto, haverá uma câmera, um olho eletrônico que, como previu o britânico George Orwell, vigia a tudo, a todos, a toda hora. Se algo suspeito ocorre em algum local, em minutos os agentes da Scotland Yard acorrerão. Londres é a cidade do Big Brother.

Seis meses atrás, o brasileiro Guilherme de Almeida, que mora e trabalha na Inglaterra há cinco anos, envolveu-se em uma discussão com um balconista de loja no centro da cidade. Tratou-se de um desentendimento comezinho, nada grave, mas a altercação se deu em um tom um pouco mais elevado do que uma conversa amistosa. Irritado, Guilherme saiu da loja, foi para a estação ferroviária e tomou um trem para o local onde havia deixado seu carro. Entrou no carro e rodou até sua casa em Walton Thamis, distante 40 quilômetros do centro. Quando já estava no recôndito do lar, a campainha tocou: eram agentes da Scotland Yard. Queriam saber o que havia ocorrido na loja, perguntaram se estava tudo bem, se o assunto tinha sido encerrado ou se haveria represálias. Guilherme não se importou em responder às perguntas, disse que até se sentiu seguro com a intervenção pacífica da polícia, mas se indagou: como é que eles o seguiram? É o Grande Irmão em ação.

O trânsito
As câmeras servem também para o controle do tráfego de veículos, outra preocupação obsessiva do Estado inglês. Além da extensa malha ferroviária subterrânea e de superfície, além dos ônibus espaçosos e confortáveis de dois andares de altura, além dos black cabs, os célebres táxis londrinos, além de tudo isso, existe transporte fluvial e, para a Olimpíada, foi inaugurado um serviço de teleférico a fim de ligar, a 50 metros do chão, o norte da cidade com o maior centro de exposições do Reino Unido, o monumental ExCel, onde ocorrem as competições de judô, boxe e esgrima. Para se ter uma ideia do que é esse ExCel, um dado: lá funcionam nada menos do que 350 bares e restaurantes.

Os pedestres
Os ingleses organizam e planejam até o caminho dos pedestres. Nas estações de trem, nas rodoviárias e nas calçadas próximas das sedes da Olimpíada, cavaletes de metal são dispostos por funcionários públicos, formando corredores. Quem vem, vai só por um lado; quem volta, volta só pelo outro. Assim, ninguém se atrapalha, nem no local mais civil de uma cidade: a calçada.

De onde os londrinos tiraram o know how para se comportar com tamanha racionalidade?
Da privação.
Londres passou quase um ano sob bombardeio nazista na II Guerra. Em meio a este período, a Luftwaffe despejou bombas incendiárias durante 57 dias consecutivos nas cidade. Os ingleses tinham de se organizar para sobreviver, tinham de superar o terror da morte, tinham de conviver em apertados abrigos antiaéreos, para onde precisavam se deslocar com calma e sem atropelos. Depois, tiveram de reconstruir a cidade prédio a prédio, rua a rua. Como fizeram isso? Tendo a ordem por base. O sucesso por fim.

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